segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Cabelo e identidade

Penteados afro - Quilombolas de Nova Vista do Ituqui
Outro dia fiquei inquieto ao ouvir uma pessoa falando com um companheiro quilombola a respeito de seus cabelos, do quilombola, que estava feio o corte que ele havia feito e que por isso o andava escondendo debaixo do boné. O primeiro pensamento que me veio de assalto foi a canção de Chico César: “respeitem meus cabelos brancos, chegou a hora de falar, vamos ser francos, pois quando o preto fala o branco cala ou deixa sala com veludo nos tamancos, o cabelo vem da África junto com meus santos... se eu quero pixaim, deixa, seu quero enrolar, deixa, se eu quero colorir, deixa, se eu quero assanhar, deixa, deixa a madeixa balançar”. Para os povos africanos os penteados são sinônimo de beleza, criatividade e identidade. Embora tenha iniciado a discussão com o termo feio não quero aqui filosofar sobre o conceito do belo, deixo essa questão para os filósofos de plantão. Quero enfocar os cabelos como sinônimo de fortalecimento da auto estima da pessoa, pois foi isso que mais me incomodou naquele momento. As comunidades quilombolas historicamente sofrem um processo de exclusão e invisibilidade social ainda muito acentuado, prova disso é que se você perguntar a qualquer pessoa que esteja caminhando pela orla da cidade se há comunidades quilombolas em Santarém, provavelmente ela lhe responderá que não sabe, agora se você fizer a mesma pergunta para algum acadêmico de uma dessas universidades daqui eles chutarãoSaracura ou talvez Bom Jardim e se você for ao bairro de Santana, Uruará, Área Verde, Jutaí e Maicá, esses saberão responder pelos menos: Saracura, Arapemã e Bom Jardim. Faço lembrar que em Santarém existem dez comunidades quilombolas identificadas e reconhecidas. Associada a essa questão está o auto reconhecimento do ser negro ou preto, aqui a situação fica ainda pior porque todo mundo quer ser qualquer coisa e de qualquer cor, menos negro ou preto. Os motivos? Todos já sabemos. Diante de toda essa situação o movimento quilombola se lasca fazendo oficinas, seminários, palestras sobre a identidade e cultura negra para aumentar a auto estima do povo quilombola sabe para quê? Para chegar alguém de fora e dizer que o cabelo da pessoa é feio! Minha gente!!!!!!!!!!!!! Cabelo é que nem... joelho, cada um tem o seu do seu jeito e por isso todo mundo é feliz. Por isso meu povo quilombola não se importe com quem não reconhece a identidade do outro e nem a valoriza, pintem seus cabelos, cortem do jeito que vocês acharem melhor, não existe padrão, forma ou modelo estabelecido a ser seguido, quer dizer..., na verdade existem sim uns criados por aí que determinam quem tem boa ou má aparência, entramos na filosofia e na arte do conceito do belo, que é vendido pela imprensa televisionada e alienante, mas nós viemos para fazer o contrário, aliás, viemos para sermos nós mesmos do jeito que nós quisermos com cabelo feio, segundo os outros, ou não, o importante é que a identidade e a auto estima dos quilombolas seja preservada e vivificada. Se acontecer isso novamente, se não quiserem falar então apenas cantem: “respeitem meus cabelos brancos, chegou a hora de falar, vamos ser francos, pois quando o preto fala o branco cala ou deixa sala com veludo nos tamancos, o cabelo vem da África junto com meus santos... se eu quero pixaim, deixa, seu quero enrolar, deixa, se eu quero colorir, deixa, se eu quero assanhar, deixa, deixa a madeixa balançar”.
Por: Aldo Lima

2 comentários:

  1. Maravilha de trabalho e declaração.
    É preciso valorizar a auto estima e confiança do negro; fortalecer e prservar a nossa identidade.
    O negro é belo! E nossa beleza não é rota, mas vem de um sentimento de auto valorização e da vitória sobre o preconceito.
    Parabéns pelo trabalho!

    ResponderExcluir
  2. Aldo, parabéns pelo trabalho desenvolvido irmão.
    Tarcísio
    (Coletivo Puraqué)

    ResponderExcluir